sexta-feira, 4 de agosto de 2017

MUDANÇAS - A transição no trabalho e o medo que isto gera


                                              foto retirada da net - google imagens. 



Como é difícil mudar, assusta, temos medo, receios, e com isto vamos tocando uma vida que muitas vezes já não é prazerosa ou nos satisfaz. 

Quando eu era menina e adolescente eu amava desenhar e pintar. Depois quando tinha em torno de 20 anos cheguei a abrir uma loja para vender peças que eu pintava que acabei fechando pouco tempo depois, pois não tinha como cuidar da loja e ao mesmo tempo fazer as peças. 

Fiz faculdade, formei-me em Administração e comecei na hotelaria através de um estágio. Foram 18 anos. Virei uma executiva, viajava muito, negociava, era estrategista. Trabalhei para grandes hotéis do Brasil em Minas, Nordeste, São Paulo e até Buenos Aires e Santiago de uma grande rede de Hotéis mexicana. Até o dia que sofri um ataque de pânico. Acordei sem respirar. Ou achei que não respirava, até hoje não sei. Fiz um check up completo e nada apareceu. Fui parar num médico psicossomático que me medicou naquele momento, mas deixou claro que não estava curando a causa e indicou a terapia. 

Lá fui eu fazer análise com um psicanalista. Já faz 10 anos agora. A análise realmente leva tempo, mas aprendi que o grande benefício é que ela realmente muda as coisas, e não apenas desloca para outro lugar. Quando mexe em algo é pra valer. Não é fácil mudar coisas que estão encalacradas na gente, que vem de anos atrás, que se cristalizaram, que viraram uma espécie de ordem e lei. 

Durante a análise me voltei para o intelectual, fui fazer a faculdade de Filosofia que desejava, e estudei antropologia em um grupo por 03 anos. Aprendi muito. Eu sempre me sentia meio burra quando lia artigos com aqueles temas filosóficos, ou palavras que eu não conseguia interpretar. Então valeu a pena. A antropologia me ensinou muito mais sobre a vida e como viver do que sobre a ciência em si. 

Mas continuava um buraco dentro de mim. Eu ficava rodopiando em volta e nada o preenchia, satisfazia. Foi um processo longo, difícil, mas que é possível de travessar. Eu já havia voltado a pintar, comecei como um lazer, uma diversão. Então começou a vender. Abri uma loja no ELO7 e foi vendendo. Mas o que me faltava era coragem de acreditar que se pode viver disto, que se pode trabalhar com arte e artesanato e conseguir com isto uma autonomia financeira. 

Percebi o quanto eu estava presa a um sistema que dizia que tudo tem que ser produção = lucro, e quando comecei a produzir somente peças que vendiam eu literalmente murchei, e fiquei bloqueada. Eu vi diante de mim uma linha de montagem e não mais de criação. E ouvia comentários dizendo que tinha que ser assim, para dar lucro. Eu também sentia medo de não dar certo e ser cobrada por isto. Ter que pedir ajuda aos outros. E acabou acontecendo. Foram dois meses que fiquei parada e entrei num processo depressivo, de solidão. Fiquei triste, e sentia uma dor profunda dentro de mim. 

Como é difícil assumir seu desejo e mudar. Fazer o que realmente queremos. E o mais difícil, acreditar nisto e confiar de que o resultado vem e é possível sim ganhar seu sustento com este trabalho. O momento é difícil, é de crise, a venda de artesanato é algo mais supérfluo, mas as pessoas continuam comprando uma peça ou outra. Há formas de oferecer produtos que sempre vão ser desejados porque atendem também a algo muito importante para a pessoa, como seu casamento, o nascimento de uma criança, ou uma peça bonita que vai decorar sua casa e também não é algo que custe uma exorbitância, está dentro das possibilidades financeiras das pessoas.

Nesta segunda retomada consegui fazer uma divisão no meu trabalho. Hoje mantenho o que chamei de linha de montagem, apesar de que cada peça é única, e sempre feita com muito amor e dedicação, não é algo massificado. Só que não preciso mais criar em cima dela, já sei o que tem que ser feito e como. Por outro lado abri mais ainda o espaço para a criação. E o grande passo foi abrir o espaço interno, ou seja, deixar a mente fluir e a criatividade vir, sem medo do que os outros irão achar ou se vai vender. E o incrível é que cada vez que faço algo assim é justamente a peça que vai receber mais elogios e comentários. Aí ela se torna uma peça de "linha de montagem" rsrsrs.

E a arte, a criatividade, a criação autoral é algo gratificante e libertador acima de tudo. E reflete em nossas vidas. Vamos nos sentindo mais livres, menos presos ao sistema ou a certas regras que nem sei porque inventaram, porque não trazem benefícios, apenas controlam os outros para que nada mude, nada se crie de novo.

Saí do mundo executivo onde o que imperava era a estratégia, a competição, o resultado e os lucros para um mundo criativo, enriquecedor, mais livre, e que também gera lucro. E traz prazer, contato com pessoas mais leves, com ideias ótimas, também criativas. Só posso dizer que valeu a pena  apesar do medo que senti na travessia neste modo de viver e de ganhar a vida. Aprendi a acreditar no meu trabalho e a valorizá-lo, coisa que antes eu não consegui devido à competição existente. Sempre tinha que ser O melhor, vencer, competir e ganhar. Como valorizar algo num mundo assim? Na arte cada peça é uma, ela não compete com a outra. E há vários gostos, sempre há alguém que vai querer uma peça roxa ou magenta, e tem aquela que gosta do azul clarinho, do branco. Então não há como dizer que a azul clara é mais bonita que a roxa.

Alguns irão gostar de algo simétrico e outros do assimétrico. Alguns querem peças bem formadas com curvas redondas e outros preferem uma moldagem em barro torta, sem muitas definições. E neste leque você tem espaço e liberdade para ir criando. Tenho meu gosto pessoal, mas posso também libertar minha criatividade para fazer coisas diferentes disto, e aprender a apreciar outras coisas. Já me aconteceu de um cliente me pedir algo que de início pensei - que estranho vai ficar e quando pronto fiquei encantada com a peça.

Por isto, apesar do medo, da insegurança é preciso enfrentar e ir em busca daquilo de que realmente gostamos e nos faz bem. 


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